Tempestade de ideias

Lia Ernst Hans Gombrich. Encantado com Leonardo da Vinci, ao anoitecer de uma tarde amazônica. Absorto. Os olhos em “Estudos anatômicos”, laringe e perna, de 1510. Quanta perfeição! Pura arte e anatomia nunca vistas. A última ceia. Mona Lisa. Os olhos deslizam das páginas. À esquerda. Clarões, nuvens, luzes. Sinalizadores do pássaro de aço que da Vinci idealizara. Os olhos voltam-se para as páginas. Mona Lisa. Uma força me impele a erguer os olhos. Duas mãos estendidas por sobre a poltrona 10A chegam a me assustar. O sinal da presença humana tirou-me dos momentos de transe total nos quais vivia cada detalhe de Gombrich sobre da Vinci. A respiração oscilou o ritmo. Um rosto de menina surge entre aquelas mãos, na altura dos cotovelos, lança-me um sorriso terno, infantil e diz; “Tio, porque o senhor deixa aquilo aberto?” e dirige o braço direito para a janela da poltrona 11A na qual eu estava sentado. “É para olhar a nuvens e curtir essa sensação de liberdade”. Sorri. Ela sorriu. “Tomei um susto com as suas mãos”. Ela abriu ainda mais o sorriso. CONTINUA!

quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Trovoadas


Há em tudo um indício
De que algo pode vir
Trovoadas, vento forte
Relâmpagos de Sul a Norte
Indicam que um temporal
Pode desabar ao fim do dia
Começa com uma ventania
Espalha-se por oceanos
Deságua a água do mundo
Em minutos ou segundos
A inundar a cidade.
Deixa um rastro de dor
Sangue e destruição
Parece ser o único jeito
De a natureza fazer reação.
Os homens matam, desmatam
Da Terra exploram quase tudo
Em forma de ventania
As águas choram a sangria

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Acolhimento


Educar é ato de amor
De entrega e acolhimento
É dar ternura, carinho e atenção
Entregar a alma e o coração.
É receber um ser frágil,
Às vezes imaturo e inseguro
E devolver a confiança e a dignidade
A quem não quer vencer a fragilidade.
Transformá-la em gigante
Fazê-la buscar em si
A força pra vencer os medos
E dobrar seus monstros mentais.
É impor limites e abrir horizontes
Como se faz com um filho
Arrancar da alma os gritos
Que a libertem dos ritos.
Perfeita harmonia entre amor e ódio
Entre sonhos e fantasias
É transformar-se de professor em amigo
Sem que se perca o carinho.
Segue, livre, liberta dos monstros
Que despertaram pesadelos
Cheiros, carinhos, afetos
Libertam-nos de todos os medos.

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Pêssego


Teu corpo exala um suave gosto de desejo
Que se revigora na morenez da pele
Como um pêssego macio que provoca cio
E toma meu corpo como a mente impele.
Para uma viagem da refém-fantasia
De sugar tua pele em rito de magia
Descer pelas cosas e pousar em teu ombro
Igual borboleta a voar nas paragens.
A deslizar, mansa imagem, nas costas
Nossas mãos te tocam, peles arrepiam
Em branca-bermuda, quero-te desnuda.
Como se teus poros fossem do pêssego a casca
E eu arrancasse, em gesto ousado
O nó que insinuas: devo desfazer
Assim deixar-te nua, a minha mercê.
Mordo calmamente cada parte da fruta
A saborear o teu gosto de trufa
Dentes que percorrem o dorso dessa massa
Tenra, doce, a provocar delírios.

domingo, 28 de outubro de 2012

Sondagens


Adoro as sondagens que faço em teu corpo
Quando te deixo o rosto vermelho de pudor
Ao despir tua pele, arrancar tua roupa
E deixá-la louca de desejo e prazer.
São doces momentos de voracidade
Quando, sem maldade, meu corpo toca o teu
Sinto-me um Zeus, teu Deus no Olimpo
Arranco de ti, urros que são meus.
Descubro teus segredos em cada beijo
Profundo, inteiro, insano tesão
Grito de paixão, quando enfim, me tocas
Liberto em cada gesto minha emoção.

sábado, 27 de outubro de 2012


O rosto não consegue disfarçar
A tristeza que brota do olhar
A te buscar em cada canto do infinito.
Pinto na tela mental “O Grito”
Como se Edvard Munch tomasse meu corpo
E assumisse a identidade dos loucos.
Mostro o torpor em cores
Tento esconder os amores
Só consigo libertar as dores.
Qualquer espaço é um quarto escuro
Seja virtual, transformo em muro
Intransponível na vida real.
Encolho-me em qualquer canto
Não deixo ninguém ouvir meu pranto
Nem ver as lágrimas que dos olhos correm.
No rosto, nos olhos, em todo o corpo
Cristais líquidos deixam suas marcas
E eu ali, de forma opaca
A perder tudo o que a vida me dá.

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Cintilantes


Entendo pouco desse teu descaso
Dessa tua intensa busca de prazer
Em me atrair para a tua arapuca
Para tentar me fazer seduzir.
Depois que me deixo encantar
Por esses teus olhos cintilantes
Teu doce modo de se entregar.
Nem que seja apenas uma mentira
Tua maneira de me fazer voltar
Virar um mote dessa tua ira.
Do teu veneno em goles tragar.
Braços amarrados, presos ao pé da cama
Vivo prisioneiro desse teu olhar
Que me transformou em mero cachorrinho
Arranco a coleira pra me libertar.

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Direções


Recolher-se em um quarto escuro
Não mudará os rumos do mundo.
A vida não tem meio termo
Positiva ou negativamente
Haja o que houver em tua mente
Tudo passa: até nós passamos.
Não me vejo como um projeto divino
Com tudo escrito sobre o meu destino
Como se eu fosse apenas um instrumento
Para confirmar o intento
De alguém que já me programou.
Tenho um Deus na minha mente
Que às vezes me trai até inconsciente
Eu, porém, decido minhas direções.

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Três, quatro, três


Em cada espaço ou Avenida
Dos cantos que te vi cidade.
Manaus porta-do-inferno
Por conta dos que te agridem
Iludidos, dizem que o progresso
É a prova do teu sucesso.
Teus bairros são amontoados
De casebres e desmandos
De um poder público que te nega
Ao longo de mais de trezentos anos.
Viadutos e passagens de nível
Foram apresentados como o incrível
Poder de “obrar” dos governantes
Aquela Manaus de antes
Virou cidade do depois
Do lixo e dos buracos nas ruas
À falta de energia
O Lugar da Barra de um dia
Hoje é mera caricatura.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Promessas


Em cada olhar, em cada tecla
Até nos álbuns de fotos virtuais
Promessas transbordavam feitos mananciais.
Por serem vivas fontes de desejos
Intensos beijos passaram a incomodar
Como fantasmas que tiram o sono
Ou pesadelos a nos torturar.
A própria pele emitia sinais
Desse desejo em suores e arrepios
Como se os corpos desse novo casal
Fossem dois bichos ferozes no cio.
Uma febre louca toma a medula
Molha nossos corpos, ferve em calafrios
Desço minha língua pelas tuas curvas
Mordisco os caroços dessas tuas uvas.
Sugo o teu vinho, ao lamber tua taça
Teus lábios pequenos, carnudos ou grandes
Descem bem-suaves por minha garganta.
Respiras ofegante, soltas mil gemidos
Quanto mais te bebo, mais ouço teus urros
Como onça selvagem, soltas alguns esturros
Descanso, sereno, sobre o teu umbigo.

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Confiança


É como você diz: dê-me 1 real
Mas não me dê confiança
Porque o sinal fica verde e avanço
A demonstrar toda a minha ousadia.
Faço de um mastro um poema
E da lona a poesia.
Que é estar e circo
Em cenas de amor e magia.
A cada toque um beijo novo
Em cada beijo, nova entrega
Quebro padrões, derrubo as regras
A demonstrar todo o desejo.
Sinto tua falta, quero teus beijos
Até o sono você me fez perder
Ao ver aquele quadro de Mona Lisa despojada
Mostras o quanto sabes se fazer desejada
Até quando finges assim não querer.

domingo, 21 de outubro de 2012

Grilos e galhos


Instalo meus grilos e galhos
E passo a te ver pelas frestas
Da janela que a mente isola
Dos olhos por onde o corpo chora.
À espera de tê-la, um dia estrela
Em meus braços como se fosse fonte
De eterna magia e encanto.
Nos galhos penduro o desejo
Sem grilos te engulo em um beijo
Construo imagens, mensagens de nós.

sábado, 20 de outubro de 2012

Temporal


A chuva desce lá fora como se nada fosse
Só que é tudo o que o caboclo deseja
Quando a estiagem do leito transborda
E a água-mãe do solo não brota.
É temporal ou chuva fina
A água do solo não brota fina
A chuva em ebulição isola
Os brotos das plantas lá fora.
Telhados, paredes, as casas
Inteiras perdem a estrutura
Os ventos arrastam os sonhos
De uma tranquila vida noturna.

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Estiagem


Água não vejo nem das barragens
Meu rio, no cio, deixa-me em seca
Onde havia água hoje é barro batido
Lama não há na beira do meu rio.
Ele alimenta com água potável
Os lados direito e esquerdo da cidade
Na seca, porém, o rio vira córrego
E vira-se contra nós que o atacamos
Quando na cheia empilhamos
Todo o tipo de lixo no teu leito.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Pedinte


Não tenha inveja da minha liberdade
Do fato de eu andar pela cidade
A te incomodar em cada esquina.
Com esse olhar pedinte de menina
Peço, imploro uma esmola
Ou um prato de comida.
Há um porco-imundo que me olha com desejo
Já tentou roubar-me até um beijo
E levar minha infância a reboque.
Não chegou me dar nenhum toque
Sequer uma carícia no rosto
Escarrei na cara dele com nojo.
A rua é minha casa, meu leito
Sou digna de muito respeito
Ninguém irá me prostituir.

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Canções


Professo um estilo de vida
Que não se encontra em cada esquina
Que não se confunde com bem-querer
Esconde nos gestos imenso prazer.
De passar pelo mundo como um vagabundo
Um ser que não se curva às convenções
Abomina regras, destrói os padrões
Vive mundo agora a fazer canções.
Não dá conselhos, nem distribui fórmulas
Faz da contrarreforma seu jeito de ser
Consome tapioca, pamonha ou canjica
E na humildade onde mais se fixa
Como marca sincera das suas emoções.
Vaga bar em bar a tomar um pileque
Descobre o prazer de ser doce moleque
A passar dos limites impostos pelo coletivo
E a gozar cada segundo de um ser afetivo.

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Homo


Sou homo porque sou homem
E afetivo por ser mulher
Homem e mulher em um mesmo corpo
Mulher e homem em um só espírito.
Teu preconceito não admito
Sou um ser vivo igual a ti
Nascer macho ou fêmea não tem escolha
Homem ou mulher é questão de opção
A ti não interessa com quem durmo ou vivo
É meu direito ser homoafetivo.
Católico, evangélico, budista ou não
Não misturo sexo com religião
Cada um que tenha o Deus que quiser
E escolha pra vida: homem ou mulher.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Sabedoria


Conhecimento e sabedoria
Não se repassam dia-a-dia
São acumulados ao longo da vida
Experimentados a cada segundo.
Por quem exercita a tolerância
E o respeito às diferenças
Quem investe nas experiências
E nos experimentos, sem medo.
Professor não ensina, professa
Não critica quem protesta
Faz-se sábio ao tolerar.
Se assim não for, não é professor
Vira um mero transmissor
De conceitos e conteúdos.
Uso a sociedade como escudo
Para esconder seus traumas
E o que lhe fere a alma.
Dizer sim à homofobia
Ou a qualquer tipo de preconceito
Ao invés de sabedoria, é defeito.
É marca de plena ignorância
Da deplorável intolerância
De quem usa a fé de todo o povo
Para pregar ódio que dá nojo.
Escarro, jogo o meu catarro
Sobre o lixo que são esses bichos
Que se utilizam da profissão
Para sujar até a religião.

domingo, 14 de outubro de 2012

Posse


Teu homem não é teu dono
Nem patrão, nem patrono.
Não tem a posse do teu corpo
Por ser marido ou namorado
Nem por dividir um teto
Ou por trocarem afeto.
A vida a dois não dá direito
E nem torna sem efeito
A liberdade de ir e vir.
Quando te declararem amor
E “só ou se você for”
Tenha cautela e desconfie.
Pois quem ama não toma posse
Nem se permite ser tomada
Ainda que a ela ofereçam
O título de namorada.

sábado, 13 de outubro de 2012

Muito


Tenho pouco a dizer, muito a fazer
Para transformar meu mundo
E dar alento ao moribundo
Que pena em uma maca de hospital.
É meu dever ter uma resposta
Para os que não comem a cada dia
A esses não servem apenas homilia
Nem a hóstia sagrada do senhor.
Não sabem nem o que é alimento do espírito
Mal conseguem manter o corpo em pé
Excomungam os rituais de fé
Pela sede e fome que os afeta.
Não conhecem nenhum esteta
E suas obras introjetas.
Sonham com uma maçã real
Sem pecado e original.
Sonham com uma melancia
Que seja até sobra de feira
Como bichos percorrem as lixeiras
Invisíveis aos olhos de ti que passas.
Um grão de arroz ou de milho
É o muito que eles cobram
De ti, insano e insensível
Que diariamente os ignora.

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Criança


É dia de reconhecer o brilho
Que sai do olhar de um ser tão puro
Deixar transbordar em esperança
A pureza de esse ser criança.
Pouca malícia: nenhuma maldade
Faz da pureza seu jeito de vida
Mostra a essência de ser tão querida
Sem se contaminar pela hipocrisia.
Da vida em grupo, em sociedade
Ainda não sabe todos os segredos
Entra sem medos em qualquer disputa
Um ser ainda sem face oculta.
Criança um dia é pouco para ti
Tens uma vida inteira a partilhar
Com os que te cercam de carinho e mimos
Na doce entrega do verbo amar.

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Visões


Fecho os olhos vejo do teu rosto
Surgir o brilho fulgurante de um sorriso
Transformo-me em criança, quase um feto
Feliz por receber teus carinho e afeto.
Fundem-se visões em gotas, em cristais
De água como fossem fractais.
Pedras preciosas refletem luzes
E iluminam teu sorriso que seduz.
A tez vermelha, sinal de nobreza
Pele leitosa, franco-italiana
Bruto cristal de raríssima beleza
Brotam da face dessa paulistana.
Na água branca ou Vila Mariana
Um out-door provoca e excita
Em leds multicores teu rosto ilumina
Toda a extensão da Avenida Paulista.

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Por e-mail


Em cada letra ou espaço em branco
Nasce o encanto por força de um olhar
Que mal trocamos e já cultivamos
No jeito doce e terno de teclar.
Nossa alma passeia de um canto ao outro
Em bits e bites o coração toca
Na ponta dos dedos seguem os segredos
Que nos permitimos juntos desvendar.
Despimos o espírito dos preconceitos
Não importa o meio, até por e-mail
Curtimos a delícia de se entregar.
A esse passeio das mentes, dos corpos
Por sobre o teclado os dedos deslizam
E revelam ao outro um jeito de amar.
A distância e o tempo são meras convenções
Profanadas por esse desejo de desvendar
O que a força cósmica nos quer indicar.

terça-feira, 9 de outubro de 2012

Comportado


Sou totalmente quadrado
Meu poema é comportado
Dificilmente sou ousado
Respeito quem está ou meu lado.
Sou incapaz de usar um porra
Ou um puta que pariu
Detesto quem fala merda
E sou calmo pra caralho.
Ainda não sei o que é tomar no cu
Nunca mandei ninguém para lá
Se não acreditas no que falo
Então vá pra casa do caralho.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

sábado, 6 de outubro de 2012

Profano


Sinto-me um menino, um infante
A tentar prender com um barbante
Um brinco em tua orelha.
Sem jeito, teu rosto cora
A pele fica vermelha
Você tenta disfarçar.
Abre um sorriso, solta a alma
Olha o infinito, busca a calma
Não esconde o prazer.
De ter as mãos admiradas
A finesse revelada
Em cada gesto, cada olhar.
Teu sorriso me encanta
Será tua raiz em Atalanta
Ou vens de alguma Santa
Catarina, gaúcha
Ou tua semente é de Sampa?
Não importa tua origem
Perco o prumo na vertigem
Profana dessa tua gargalhada.
Que embevece minha alma
E de joelho desço rés
Ao teu sublime par de pés.
Toco com a ponta dos lábios
O roxo tênis Adidas
Não como subserviência
E sim por pura reverência
A demonstrar que és querida.
Não me faço de rogado
Nem te quero puritana
Terei o prazer de um dia vê-la
Com um par de roxas havaianas?