Tempestade de ideias

Lia Ernst Hans Gombrich. Encantado com Leonardo da Vinci, ao anoitecer de uma tarde amazônica. Absorto. Os olhos em “Estudos anatômicos”, laringe e perna, de 1510. Quanta perfeição! Pura arte e anatomia nunca vistas. A última ceia. Mona Lisa. Os olhos deslizam das páginas. À esquerda. Clarões, nuvens, luzes. Sinalizadores do pássaro de aço que da Vinci idealizara. Os olhos voltam-se para as páginas. Mona Lisa. Uma força me impele a erguer os olhos. Duas mãos estendidas por sobre a poltrona 10A chegam a me assustar. O sinal da presença humana tirou-me dos momentos de transe total nos quais vivia cada detalhe de Gombrich sobre da Vinci. A respiração oscilou o ritmo. Um rosto de menina surge entre aquelas mãos, na altura dos cotovelos, lança-me um sorriso terno, infantil e diz; “Tio, porque o senhor deixa aquilo aberto?” e dirige o braço direito para a janela da poltrona 11A na qual eu estava sentado. “É para olhar a nuvens e curtir essa sensação de liberdade”. Sorri. Ela sorriu. “Tomei um susto com as suas mãos”. Ela abriu ainda mais o sorriso. CONTINUA!

sábado, 29 de setembro de 2012

Vazio


O branco da página ilumina-se
Com o escuro preto das letras
Entre uma e outra um ponto, uma vírgula
Marcam a cadência da leitura.
Ao deixar algumas reticências...
Permito que você conclua.
Posso marcar o final de tudo
Com um ponto surdo e mudo
Mas se te deixo seguir em frente
Trata-se de um ponto seguido
Quando não interrogo nem exclamo
Não quer dizer que te amo
Significados nascem, crescem, vivem e morrem
Entre os espaços em branco.

Pradarias


Enlaço, em um laço, tua crina,
Cavalgo em teu corpo de felina
Como se os detalhes fossem pradarias
A serem exploradas dias após dias.
Às vezes nem faço concordância
Verbal, nominal ou as duas juntas
Elimino possibilidades de perguntas
Ao cavalgar-te por longas distâncias.
A voz segura tremula em gemidos
Ao simples toque da língua em teus ouvidos
Em sinfonia o ar vence as narinas
Quando os lábios tua flor desvirgina.
Vejo no umbigo o início do teu pasto
A grama é rala, a vontade viçosa
Cravo com força a ponta do meu mastro
Marco limites nesse território.
Penugens sobem com a força do vento
Uma flor brota abaixo do umbigo
Cavalo e potra perdem-se por dias
Em cada curva dessas pradarias.

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Cheiro de flor


Tem cheiro de flor
O intenso odor
Que vem do interior
Das grandes e pequenas pétalas.
Tenho vontade de morder
Saborear e comer
Sugar e até beber
O néctar do teu prazer
Passo a língua e o nariz
Sinto que ficas feliz
Quando deslizo em ti.
O toque dos lábios revela o desejo
Do beijo que em ti não cheguei a dar.

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Patifaria


Sou fã da patifaria
Que fazemos todo dia
No escurinho do quarto.
Nada é proibido
Somos dois grandes bandidos
No jogo da entrega total.
Vale tudo em cada corpo
Da ponta do pé ao rosto
Importa só o prazer.
A língua e a ponta dos dedos
Descobrem cada segredo
Escondido no olhar.
Ávidos e insaciáveis
Derrubamos os entraves
Em cada toque a deslizar.
Pela tua geografia
Nada em ti me sacia
Tua flor me inebria.

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Padrões


Não gosto das coisas quadradas
Dos padrões, de quase nada
Que me lembre de tradição.
Quero as coisas sem nexo
Tudo em forma de protesto
Como se beirassem o caos.
Nada de fotos ou grafias
Tudo em prosa ou poesias
A explorar finitos temas.
Jogo para o alto os fonemas
Caem grunhidos ou monemas
A arrancar todas as raízes.
Não quero galhos nem caules
Que me façam lembrar dos males
De se levar a vida em função do outro.

Donos do mundo


Eles se acham donos do mundo
Tratam-nos como se fossemos vagabundos
E não tivéssemos nenhum tipo de direto.
Julgam-se donos da nossa vida
Como sem nem vida tivéssemos
E deles fossemos escravos modernos.
Querem domar nossos pensamentos
Transformar-nos em devotos
E serem donos dos nossos votos.
Forjam candidaturas à surdina
Transformam velha em menina
E querem nos obrigar a nela votar.

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Madrugadas


Quando o teu olhar cruza com o meu
Transformo-me em pecador e ateu
As pernas tremem as mãos ficam molhadas
Dias inteiros parecem ser só madrugadas.
Perco o sono, a lucidez vai embora
Passo a te desejar com o passar hora
Você não chega e não deita em minha cama;
É só desejo, sei, já não me ama.

domingo, 23 de setembro de 2012

Perigo


Olhos são deliciosamente perigosos
Revelam os desejos que a alma esconde
Levam-nos até para um não sei onde
A vida nem consegue nos levar.
Quando se cruzam e o corpo pulsa
Nada provocará repulsa
Ligam-se os códigos da atração
E haja fogo para tanto tesão.
Faíscas espalham-se corpo adentro
Tocar teu corpo é meu intento
Nem que seja por alguns segundos
Que me valem pelo inteiro mundo.

sábado, 22 de setembro de 2012

Latente


O sangue corre nas veias feito louco
Procura orifícios para ter vazão
Como não encontra nada que o deixe solto
Desanda a apertar o coração.
Que pulsa e o expulsa para os dutos
Orifícios e pequenos fios condutores
De todos os sentimentos ocultos
Mas também dos grandes amores.
Diante dos horrores ele também corre
Cada vez mais desesperado
Só para quando você morre
Ou talvez depois de enterrado.

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Fracasso


O amargo na boca revela o segredo
De quem não tenta nem vencer o medo
De começar uma nova disputa.
Temores são partes da vida
Ainda que o fracasso deixe ferida
A alma de quem não chegou a lutar.
Quando o medo congela o espírito e o corpo
É como se o corpo estivesse morto
Perdesse toda a capacidade de amar.

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Sonhos virtuais


Sou um ser completamente on-line
Não me procure para nada que seja real
No máximo posso fazer parte
De um sonho que seja virtual.
Portanto nem pense em me amar
Ou desejar qualquer parte do meu corpo
Não tenho agenda para encontros
Se insistires será um homem morto.
Só tenho olhos para o que toco
No Facebook, Twitter, MSN ou chat
Só posso te dar um cantinho de tela
Ou uma gota do meu amor-moque.
Se em mim colas, apagas o fogo
Quero ser livre para qualquer gozo
A mim não basta sexo virtual
Se não te encanto na vida real.

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Manipulação


Você não se entrega por medo?
Ou me quer manter em segredo
A dizer que não deve me amar!
Não queres que me vejam ao teu lado
Que pensem: sou te namorado
Mas tentas me preservar.
Como se fosse um brinquedo
Um bonequinho entre os dedos
Para em gozo me manipular.
Não te darei este gosto
De sugar o meu gozo
Não me deixarei enganar.
Por esses suspiros, sussurros
Ainda que solte muitos urros
Você não vai me pegar.

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Desdenhas


Desdenhas do que por te sinto
Afirmas sempre que minto
Ao falar do meu amor.
Não acreditas que te desejo
Nem no meu molhado beijo
Quando toco os teus lábios.
Mesmo que eu enterre a língua
No infinito da tua retina
Ainda sou desdenhado.
Se eu morder teus pormenores
Fingirás que nada sentes
Só para me deixar pior.
Por isso mordo os lábios a boca
Tento deixá-la louca
Deixá-la pelo menos em dúvida.

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Dubiedade


O sentimento que por ti tenho
É muito sutil e sereno
Pode ser amor ou mero veneno
A me cegar o entardecer.
Chega a noite e eu afoito
Não tenho forças nem para o coito
Muito menos pra te deixar.
É dúbio e ambíguo esse sentimento
Viver contigo cada momento
De alegria ou de dor
É a prova perene desse ardor.

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domingo, 16 de setembro de 2012

Teu voto


Tenho de escolher entre um e outro
Para depositar meu voto
Ou até mesmo uma e outro
Ou outro e uma, ou outra e outra
Na hora de decidir em que votar.
Procuro propostas, encontro engodos
E até indícios de corrupção
O bom disso tudo é que esses indícios
Ajudam-me na hora de tomar a decisão.
Político bom não tem passado
Constrói o presente com atitudes
Joga falsas promessas em alaúdes
E enterram nossas desilusões.
Quem paga teu voto não merece tê-lo
Escolha a quem dá-lo com apreço e zelo
E cobre-o durante todo o mandato
Só assim exercerás teu direito de fato.

sábado, 15 de setembro de 2012

Podexá


Se a água na torneira não jorrar
Podexá, vou sentar com o Omar!
Pro ônibus não parar de atrasar
Podexá, vou sentar com o Omar!
Pra não deixar o IPTU aumentar
Podexá, vou sentar com o Omar!
Tem roupa suja em casa pra lavar
Podexá, vou sentar com o Omar!
Se nas ruas, carro não trafegar
Podexá, vou sentar com o Omar!
Não tem escola pro teu filho estudar
Podexá, vou sentar com o Omar!
E se eu não tenho projeto a apresentar
Podexá, vou sentar com o Omar!
Foi um engodo eu me candidatar
Podexá, vou sentar com o Omar!
Ah, os meus votos começam a minguar
Podexá, vou sentar com o Omar!
Quando não tenho outra coisa pra falar
Podexá, vou sentar com o Omar!
E o meu leitor poderá completar
Podexá, vou sentar com o Omar!

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Ruas


Tuas costas nuas
Tua tatuagem
Parecem miragem
Desenho de ruas.
Há curvas, cumes e montanhas
Em cada desenho de músculo
Como se fossem as entranhas
Do teu corpo lúdico.
Que provoca minha saliva
Deixo nu esse corpo de Diva
Sigo a linha da coluna
Vejo as maçãs da tua bunda
Fruto proibido: pecado do desejo
Meu corpo responde com calor e frio
Sempre que sonho com teus beijos.
Desço o olhar pelas coxas
Roliças, durinhas, perfeitas
São nesses detalhes do teu endereço
Que me perco e viro-me pelo avesso.

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Prioridades


Dizem que preciso eleger
Alguns motivos pra viver
Selecioná-los em ordem crescente
Ou, quem sabe, decrescentes
De acordo com as prioridades.
Devo formar uma lista
De 1 a 10 ou de 10 a 1
E como encaixar você?
Serias 10 ou serias 1?
O que hoje é 10 amanhã não o é.
Pode passar a ser apenas 1.
Viver é fazer escolhas
Certas ou não, pouco importam
Porque certo ou errado não passam
De criações da mente humana.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Trabalhadora?


Em qual tipo de democracia vivemos?
A do pensamento único?
A da vaca de presépio?
Que o governo manda e desmanda?
E temos de obedecer?
A greve que é um direito
Agora é contestada
Por quem um dia foi Trabalhador e Partido
Das ditas Classes operárias.
Desditas as mentiras e verdades
Deparamos-nos com a realidade
Em quatro meses de greve
Sofremos com o massacre.
Da mídia vendida, de um Governo infame
Que só existe para ser unânime
De uma presidente mão-de-ferro e ditadora
Que manipulou funcionários públicos
E dizimou a classe trabalhadora.

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Ratazanas


Há que opte por viver
Em eterno anonimato
A rosnar eternamente
Como se fosse um reles rato.
Frequentam bueiros e esgotos
Bando de vermes, escrotos
Escondem-se por trás de máscaras.
Nefastos seres das trevas
Teu futuro é ser prolixo
E eterno habitante do lixo.

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Sede


Temos sede de justiça
E fome de reconhecimento
Das nossas lutas, dos nossos intentos.
Minha fome é de ser reconhecido
Não apenas como mendigo
E sim como um ser social.
Você me indissocia com esse olhar
Insensato e de reprovação
A me ver como um indigente
Incapaz ou um demente.
Vivo em um deserto
Indignado com o teu descaso
Minha sede é de ao menos ser olhado.

domingo, 9 de setembro de 2012

Fome


Somos comidos por dentro
Na essência do elemento
Que até o espírito alimenta.
Uma incontrolável sede de a justiça
Como parte da premissa
Da vida em sociedade.
Em cada vaso sanguíneo
Corre um instinto felino
De insaciável saciedade.
Morre o homem nasce o bêbado
A trocar os passos, trôpego
Pelas vielas da cidade.
Nas ruas assim é visto
Como um estorvo maldito
Um verme da sociedade.

sábado, 8 de setembro de 2012

Reprimidos


Sinto parte dos sentidos
Extremamente reprimidos
Quando não consigo em ti tocar.
Dois seres incisivos
A transbordar desejos incontidos
Uma vontade louca de se dar.
Tua língua percorre o meu corpo
Seguro um urro rouco
E me derramo a estourar.
O suor toma conta de pele
A respiração nos impele
A um no outro repousar.

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Independência


Dizem que o grito foi “independência ou morte”
Dado lá para as bandas do Ipiranga
Pois eu grito “quero ser de ti dependente”
Nem que seja lá em Itapiranga.
Morte? Só se não puder tê-la
Nos braços, minha noite e dia
Prefiro ser um dependente mal-acompanhado
A ser um independente, morto, e só.
Nem morto de saudade quero estar
Porque você não estará comigo
Na lembrança não é o melhor lugar
Para se ter alguém: nem amor antigo.
Às margens de um rio quero tê-la nua
Que os gritos sejam urros de prazer
Às favas com o Sete de Setembro
Não há hora nem dia pra te ver.

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Vício


Desenvolvi dependência
Desse teu jeito de me olhar
De me pegar no colo em pensamento
Beijar loucamente meu corpo
E me fazer voltar a sonhar.
Por isso deliro noite e dia
A me imaginar em teu quarto
Tua cama, tua casa.
Essa dependência louca
Que resseca minha boca
Provoca crises de abstinência
Não aprendi a lidar com a tua ausência
Nem sei o que faço na presença.
Você é a droga que circula
Entorpece a minha cura
Estremece todo o corpo
Nessa demência do louco
Vício que és em minha vida.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Aniversário


Adoro o teu jeito brejeiro
De se nega RO tempo inteiro
Mas de se entregar sempre que te quero.
Sou louco por este teu jeito
De encostar o peito em meu peito
E não dizer nada que me possa iludir.
Quero essa mulher que surge do relicário
Que comemora o aniversário
Sem ser minha, mas finge que é.
Solto as palmas, bato os parabéns
Finjo te amar como não o faço a ninguém
Confesso, porém, não resisto ao desejo.
De tê-la nos braços, a sugar os teus lábios
Amá-la com fúria de um velho guerreiro
Para me entregar no espaço de um beijo.

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Lampejos


Desejos pipocam pelo corpo
Como raios em uma trovoada
Sinto a tua pele rosada
Teu cheiro de terra molhada.
Magia que sobe pelas narinas
Revira meus poros, minhas crinas
E vai parar na minha saliva.
A língua toca o céu da boca
Como relâmpagos a cortar o ar
Recito cada poema em tuas curvas
Dessa nudez que em ti imagino há.
Nessa leitosa pele branca em neve
Deslizo e marco com as digitais
Cada milímetro do teu corpo vivo
Flashes com gosto de te querer mais.