Tempestade de ideias

Lia Ernst Hans Gombrich. Encantado com Leonardo da Vinci, ao anoitecer de uma tarde amazônica. Absorto. Os olhos em “Estudos anatômicos”, laringe e perna, de 1510. Quanta perfeição! Pura arte e anatomia nunca vistas. A última ceia. Mona Lisa. Os olhos deslizam das páginas. À esquerda. Clarões, nuvens, luzes. Sinalizadores do pássaro de aço que da Vinci idealizara. Os olhos voltam-se para as páginas. Mona Lisa. Uma força me impele a erguer os olhos. Duas mãos estendidas por sobre a poltrona 10A chegam a me assustar. O sinal da presença humana tirou-me dos momentos de transe total nos quais vivia cada detalhe de Gombrich sobre da Vinci. A respiração oscilou o ritmo. Um rosto de menina surge entre aquelas mãos, na altura dos cotovelos, lança-me um sorriso terno, infantil e diz; “Tio, porque o senhor deixa aquilo aberto?” e dirige o braço direito para a janela da poltrona 11A na qual eu estava sentado. “É para olhar a nuvens e curtir essa sensação de liberdade”. Sorri. Ela sorriu. “Tomei um susto com as suas mãos”. Ela abriu ainda mais o sorriso. CONTINUA!

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Bicho preso


Você em mim, naquele abraço
É como um laço, a me grudar.
Às vezes digo, o indizível
Quase invisível, imperceptível
Cabo de aço, frio punhal
A me ferir.
Gotas de sangue
Escorrem entre os dedos
Esvaem-se segredos
Grudados em espumas
Que batem nas pedras
Lapidadas pelas curvas
Pelos, sulcos e vulva
Por esse cheiro de uva
Que brota do teu ser.
É essa essência forte
Que brota do teu corpo
A me transformar em bicho-louco
Preso pelas narinas
Feito água a deslizar sobre as pedras
E desaguar no rio
Experimento nesse odor
Teu gosto de fêmea no cio.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Risos


Basta lembrar tua tez vermelha
Para um riso meu rosto tomar
Sentir o sangue quente em tua face
Confesso, é fato, me faz delirar.
Fico a imaginar tua pele-neve
Em toda a extensão que a mente deixar
Não há limites para risos e afetos
Que os seres vivos conseguem trocar.
Cada vez que te abraço ou enlaço teu ombro
Pressinto assombro, quase um torpor
Será que tememos a clássica flechada
Daquele bichinho inocente, o amor?

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Mentes


Tudo o que a mente não condena
Parece valer a pena
Para quem se diz humano.
Tudo o que é humano
Quando se transforma em desengano
Parece ser animal.
Não há limite para a mente
Nem mesmo quando mentes
Ao dizer que me amas.

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Mensaleiros


Agora me aparecem petistas
Tirando de perfeccionistas
A dizer que o Mensalão
É pura ficção.
Dizem que para ser preciso
O pagamento seria fixo
E pago mês a mês.
Em grande parte dos casos
Certamente, não por acaso
Um foi pago de cada vez.
Mensaleiro de responsa
Pra manter a identidade
Deveria ser pago de verdade.
A cada mês passaria
Na boca do caixa e tiraria
A parte do seu quinhão.
Só assim você poderia
Acusar-nos sem heresia
De fazer parte do Mensalão.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Juras


A Língua nos prega peças
Em questões de gênero e número
Se digo juro é uma promessa
Quase nem sempre cumprida.
Mas se são juros, juro que pago
Muito embora nem pague o principal
Porque os juros transformam a dívida
Em uma bola de neve de Natal.
Isso sem falar que aqui não neva
Apesar das juras que não vai chover
Dias desses alguém anunciou
Que a neve chegou a aparecer.
De jura em jura, chegamos às juras
De amor e fidelidade
Juro que pago os juros dos cartões
Como faço com as juras de paixões.


domingo, 2 de dezembro de 2012

Esnobe


Vejo a me olhar de cima pra baixo
Como se eu fosse um capacho
E você se aproveitasse disso
Para me tratar como lixo.
Você com esse jeito de nobre
Vive de aparências, é esnobe
Não tem nenhum respeito
Por quem te mantém no peito.
Trata-me como simples empregado
Mas quer me manter ao teu lado
Para te satisfazer por completo
Até na hora do sexo.

sábado, 1 de dezembro de 2012

Despojados


Tens um jeito assim despojado
Um tanto quanto ousado
De escolher o que usar
Para ter a marca do ousar.
Na forma de pintar as unhas
Cores berrantes, uma a uma
Sempre fora do normal
Porque não és convencional.
A fim de acompanhar a ousadia
Volto à pantalona todo dia
Chego a usar tamancos
Para provocar espanto.
Ponho acessórios, anéis
Mas não chego aos teus pés
Ao tentar ser despojado.